O celular destruiu a vida do telefone
Marcelo Tas
135: foi o primeiro número de telefone que eu disquei na vida. Sim, apesar da cara de bebê na foto aí acima, sou um rapaz muito velhinho. Acreditem: o número do telefone da casa do meu avô João, em Ituverava, interior de São Paulo, tinha apenas três dígitos.
Bastava enfiar os dedinhos na rodela preta e girar: 1, 3, 5… Depois de algum suspense, surgia a voz de vó Julieta ou do próprio vô João do outro lado da linha. Ligava só para conferir a novidade. Morávamos a duas quadras dali.
Paradoxalmente, hoje o excesso de comunicação tornou mais difícil encontrar as pessoas pelo telefone. E, pior, arrasou a qualidade das conversas. Mas eu sei quem é o grande culpado. É ele: o celular.
A chegada desse verme da era moderna provocou uma avalanche de problemas. O primeiro deles: os novos números a serem decorados. Eu, por exemplo, não decorei até hoje o novo número do meu próprio celular.
O caso é grave: também não consigo guardar na memória o número do celular da minha filha adolescente. Nem o da minha mulher! Eles estão salvos na memória do aparelho. Quer dizer, uma simples bateria descarregada me deixa incomunicável com a família e os amigos.
Vejam só que coisa: em 1876, Alexander Graham Bell patenteou o telefone. Em 2004, o celular, teoricamente a espécie mais elevada na cadeia da evolução da idéia, foi eleito a invenção mais odiada do ano! É o placar do índice Lemelson-MIT, do prestigioso Massachusetts Institute of Technology, meca dos gênios das mídias modernas (http://web.mit.edu/
Segundo a pesquisa, quase um terço dos adultos norte-americanos (30% dos entrevistados) diz que o telefone celular é a invenção que mais odeiam.
Porém, como eu, confessam que já não podem mais viver sem ele. No pódio dos odiados, junto com o celular ficaram o relógio despertador (25%) e a televisão (23%).
Bem feito! O celular destruiu um dos grandes prazeres do século passado: prosear ao telefone.
Hoje, por culpa dele somos obrigados a atender chamadas o dia todo. Viramos uma espécie de telefonistas de nós mesmos: desviamos chamadas, pegamos e anotamos recados…
Depois de um dia inteiro bombardeado por ligações curtas, urgentes e na maioria das vezes irrelevantes, quem vai sentir prazer numa simples conversa telefônica? O telefone, que era um momento de relax na vida da gente, virou um objeto de trabalho. O equivalente urbano da velha enxada do trabalhador rural. Carregamos o celular ao longo do dia como uma bola de ferro fixada ao corpo, uma prova material do trabalho escravo.
O celular banalizou o ritual da conversa à distância. No mundo pré-celular, havia na sala uma poltrona e uma mesinha exclusivas para a arte de telefonar. Hoje, tomados como num transe, andamos pelas ruas, restaurantes, escritórios e até banheiros públicos berrando sem escrúpulos num pedaço de plástico colorido.
Misteriosamente, uma pessoa ao celular ignora a presença das outras. Conta segredos de alcova dentro de elevador lotado. É uma insanidade. Ainda não denunciada pelos jornalistas, nem estudada com o devido cuidado pelos médicos. Aliás, duas das classes mais afetadas pelo fenômeno. A situação é delicada. Voltarei ao assunto.
Bastava enfiar os dedinhos na rodela preta e girar: 1, 3, 5… Depois de algum suspense, surgia a voz de vó Julieta ou do próprio vô João do outro lado da linha. Ligava só para conferir a novidade. Morávamos a duas quadras dali.
Paradoxalmente, hoje o excesso de comunicação tornou mais difícil encontrar as pessoas pelo telefone. E, pior, arrasou a qualidade das conversas. Mas eu sei quem é o grande culpado. É ele: o celular.
A chegada desse verme da era moderna provocou uma avalanche de problemas. O primeiro deles: os novos números a serem decorados. Eu, por exemplo, não decorei até hoje o novo número do meu próprio celular.
O caso é grave: também não consigo guardar na memória o número do celular da minha filha adolescente. Nem o da minha mulher! Eles estão salvos na memória do aparelho. Quer dizer, uma simples bateria descarregada me deixa incomunicável com a família e os amigos.
Vejam só que coisa: em 1876, Alexander Graham Bell patenteou o telefone. Em 2004, o celular, teoricamente a espécie mais elevada na cadeia da evolução da idéia, foi eleito a invenção mais odiada do ano! É o placar do índice Lemelson-MIT, do prestigioso Massachusetts Institute of Technology, meca dos gênios das mídias modernas (http://web.mit.edu/
Segundo a pesquisa, quase um terço dos adultos norte-americanos (30% dos entrevistados) diz que o telefone celular é a invenção que mais odeiam.
Porém, como eu, confessam que já não podem mais viver sem ele. No pódio dos odiados, junto com o celular ficaram o relógio despertador (25%) e a televisão (23%).
Bem feito! O celular destruiu um dos grandes prazeres do século passado: prosear ao telefone.
Hoje, por culpa dele somos obrigados a atender chamadas o dia todo. Viramos uma espécie de telefonistas de nós mesmos: desviamos chamadas, pegamos e anotamos recados…
Depois de um dia inteiro bombardeado por ligações curtas, urgentes e na maioria das vezes irrelevantes, quem vai sentir prazer numa simples conversa telefônica? O telefone, que era um momento de relax na vida da gente, virou um objeto de trabalho. O equivalente urbano da velha enxada do trabalhador rural. Carregamos o celular ao longo do dia como uma bola de ferro fixada ao corpo, uma prova material do trabalho escravo.
O celular banalizou o ritual da conversa à distância. No mundo pré-celular, havia na sala uma poltrona e uma mesinha exclusivas para a arte de telefonar. Hoje, tomados como num transe, andamos pelas ruas, restaurantes, escritórios e até banheiros públicos berrando sem escrúpulos num pedaço de plástico colorido.
Misteriosamente, uma pessoa ao celular ignora a presença das outras. Conta segredos de alcova dentro de elevador lotado. É uma insanidade. Ainda não denunciada pelos jornalistas, nem estudada com o devido cuidado pelos médicos. Aliás, duas das classes mais afetadas pelo fenômeno. A situação é delicada. Voltarei ao assunto.